Eu, Ela e Minha Gagueira
escrito por Edmilson Martins Neto
Ela
olhava para mim esperando alguma reação, mas eu estava nervoso e tremendo.
Diante daqueles olhos acastanhados eu não conseguia agir normalmente, minhas
mãos suavam muito, meu coração batia forte e eu não ousava falar, pois sabia
que iria gaguejar. Eu estava perdido, eu a vi franzir a testa, ela estava
ficando impaciente.
-
Eu... – comecei, apenas isso, pois continuar eu não conseguia.
-
Você? – ela me olhou, curiosa.
-
E-E-Eu! – gaguejei e depois suspirei, minha chance estava perdida.
Ela
riu e ajeitou uma mecha do seu cabelo negro por detrás da orelha.
-
Eu tenho que ir. – ela disse olhando para trás, vendo o ônibus escolar na
parada. – Amanhã nós nos falamos, tudo bem?
-
Não! – eu percebi que tinha aumentado o tom de voz e ela se virou, espantada. –
Eu preciso te falar algo...
-
Então fala. – ela me olhou, esperando.
-
E-E-E-E-E-E... – e não saiu disso.
-
Olha, tenta se acalmar. – ela pediu. – Não adianta ficar nervoso, sua gagueira
só vai piorar. Respira fundo e se acalma.
Ela
segurou minha mão e colocou a outro no meu peito, esperando minha respiração
estabilizar. Coisa que não aconteceu, pois ao sentir o calor da mão dela, só
consegui ficar mais agitado.
-
Você ainda está muito nervoso. – ela me olhou e eu corei muito.
Nunca
tinha ficado tão perto dela assim. Ela era um pouco mais baixa que eu e ao
levantar a cabeça para me encarar, bem... Não pude evitar! Eu não iria
conseguir falar, graças a minha gagueira, então o jeito era agir. Por isso, a
beijei.
Eu
a beijei com os olhos abertos, sendo assim, pude ver seus olhos arregalados,
cheios de surpresa. O beijo não durou muito, ela me afastou, ainda espantada,
eu não sei bem o que senti, só sei que consegui expressar meus sentimentos e
quando isso aconteceu, pude, enfim, murmurar:
-
Eu gosto de você...
-
Nunca... – ela me olhou com o rosto rubro e ao mencionar da palavra “nunca”,
soube que tinha feito a escolha errada. – Nunca imaginei que você fosse me
dizer isso. Quanto mais me beijar. – ela começou a rir do nada.
-
Hã? – eu fiquei claramente confuso.
Isso
queria dizer que ela tinha gostado?
-
Sabe... – ela me encarou e seus olhos cintilavam. – Você nunca conversa
ninguém, nunca se relaciona com ninguém e bem... Quando eu te protegia hoje dos
garotos da turma que estavam implicando por causa da sua gagueira, eu pensei
que você só me agradeceria por isso, não que diria que gostava de mim!
-
E... – eu respirei fundo, me acalmando. – E isso é bom?
-
Bom? – ela riu, daquele jeito angelical que só ela sabia fazer. – Isso é
maravilhoso! Esplêndido! Estupendo! Eu te amo, cara! Nunca percebeu isso?
Porque acha que eu sempre te protegi? Porque acha que sempre te convido para
entrar no meu grupo para fazer trabalho?
-
M-M-Mas eu sou gago!
-
E daí? – ela perguntou. – Não sabe o quanto eu te acho fofo assim! Pensei que nunca
notaria o que eu sinto por você. Eu até formulei um plano para me confessar
para você, mas sabe como é, os garotos tem que tomar atitude.
Eu
sorri feliz, senti meu rosto quente.
-
Mas, uma pergunta. – ela me olhou, curiosa. – Porque hoje? Porque agora?
-
Dia dos namorados. – respondi rápido para não travar.
Ela
corou de novo.
-
Então... – ela me olhou, esperando.
Engoli
em seco e tomei coragem, meu coração estava acelerado, decerto iria gaguejar,
por isso, tive que falar pausadamente.
-
Você. Quer. Namorar. Comigo?
-
Eu. Quero. Sim! – ela sorriu. – Agora beijamos!
-
Hã?! – realmente, ela era mais extrovertida e direta do que pensei.
-
Agora nos beijamos! – ela explicou pulando em cima de mim e enlaçando meu
pescoço, beijando a minha bochecha.
Depois
disso nos olhamos, tão vermelhos quanto duas maças do amor, beijei-a de novo e
dessa vez fui correspondido. Ela apertou seu corpo contra o meu, minhas mãos
deslizaram calmamente até sua cintura e ficamos ali nos beijamos por vários
minutos.
Nem
percebi quando o ônibus escolar se foi, pois quando estávamos nos beijando,
parecíamos estar em outro mundo, ou melhor, nós dois éramos o mundo um do
outro, nada ao redor importava.
Só
paramos de nos beijar mesmo, pois a mãe dela apareceu de carro na frente da
escola e buzinou. É claro que ficamos envergonhados e muito, principalmente
quando a mãe dela gritou:
-
Acho bom você ir pedir permissão do pai dela para namorar!
Eu
sorri sem graça e também com medo, pois se eu tivesse que fazer isso, com
certeza iria gaguejar. O incrível, é que quando ela se afastava consegui dizer
normalmente:
-
Eu te amo.
Ela
virou, abrindo um sorriso angelical e gritou de volta:
-
Eu também te amo! – e fez um coração com as mãos, dando tchau em seguida.